quinta-feira, 6 de julho de 2006

CRONICA DO DIA - A LOTERIA

Em uma cidade do interior, dois sujeitos ganharam na loteria. Ambos eram membros da classe média baixa, eram casados e tinham dois filhos. Viviam em imóvel alugado, os filhos estudavam em escola pública e não possuíam convenio de saúde.

Os dois adotaram o mesmo critério inicial para a utilização do prêmio – uma verdadeira fortuna. Dividiram o valor em quatro partes, cada uma representando um membro da família. A partir daí, tomaram caminhos opostos:
O indivíduo “A” pegou a parte que competia a ele e a sua esposa e comprou um imóvel próprio para que não tivessem mais despesas com aluguel. O restante do dinheiro aplicou em fundos de investimento que lhe garantiam uma boa rentabilidade mensal. Enquanto não houvesse dificuldade financeira, poderia dar algum luxo à sua família e aumentar seu patrimônio, adquirindo outros imóveis que pudesse alugar e aumentar ainda mais sua renda mensal.
A parte destinada aos filhos foi aplicada em uma poupança. Todo mês, tirava um pouco do rendimento conseguido com a aplicação e podia pagar uma boa escola particular aos dois e um plano de saúde “top de linha”. Se sobrasse, dava um pouco para que eles satisfizessem seus desejos pessoais. É claro que os meninos não gostaram nada da idéia e achavam uma tremenda crueldade do pai dizer que o dinheiro era deles e não deixá-los gastar como melhor lhes aprouvessem.
Passam-se 15 anos e o cidadão “A” reside em uma bela casa. Sua fortuna pessoal é capaz de proporcionar uma vida de conforto para seus filhos e seus netos, já que conseguiu adquirir dezenas de imóveis e ações de empresas, além de possuir um sem número de aplicações bancárias. Seus filhos cursaram universidade, pós-graduação e até um mestrado no exterior e hoje são empregados em altos cargos de empresas sólidas. O mais novo sofreu muito na adolescência por causa de um problema cardíaco, mas graças ao plano de saúde que dispunha, pôde receber o melhor tratamento existente na época e hoje goza de saúde perfeita. Não acham mais o pai um sujeito cruel, mas sim um indivíduo sábio, que lhes proporcionou a vida que desfrutam atualmente.
O indivíduo “B” utilizou-se da parte que cabia a ele e deu a maior festa que o bairro já havia presenciado. Como todos ficaram sabendo que havia ganhado na loteria, na festa foi organizada uma fila de pessoas para lhe fazer pedidos pessoais. Bondosamente atendeu a todos. Desde dinheiro para um tratamento dentário da mãe da vizinha da esquerda, até um empréstimo para fazer um “puxadinho” na casa do senhor da rua de trás, todos foram atendidos e prometeram devolver o dinheiro o quanto antes. Virou o herói do bairro. Comprou uma belíssima residência, também saindo do aluguel e nada mais. A parte dos filhos ele deu pessoalmente a cada um para gastarem como bem entendessem. Um comprou três bicicletas e vários brinquedos da moda o outro, mais velho, comprou a moto mais cara do mercado, roupas, sapatos, computador e ainda sobrou um pouquinho para perder a virgindade com duas modelos que foram capa de revista masculina. Ele era considerado o melhor pai do mundo.
Passaram-se os mesmos 15 anos. Vamos encontrar o indivíduo “B” residindo em um barraco construído em um terreno invadido da prefeitura. Ele conta agora com 67 anos, mas trabalha como gari. Acontece que quando perdeu seu emprego anterior e as contas começaram a vencer, passou a cobrar os vizinhos e amigos o dinheiro que havia emprestado. A resposta em geral foi negativa, sendo taxado de mercenário pela vizinha da esquerda, cuja mãe ainda lhe sorriu com os dentes novos. O senhor da rua de trás o denunciou na delegacia como agiota, o que lhe rendeu um processo criminal e mais despesas com advogado. Outro colega de trabalho a quem emprestara dinheiro, para lhe “facilitar a vida” propôs lhe conceder um empréstimo a juros extorsivos. Sem alternativa, vendeu a casa, sobreviveu com o dinheiro alguns anos e depois achou o terreno, onde construiu o barraco.
Os filhos também não tiveram sorte na vida. O mais velho faleceu há alguns anos, quando caiu de moto e não encontrou vaga no pronto socorro municipal. O mais novo concluiu o ensino médio, mas está a dois anos desempregado e vive às custas do pai. O Chama de fracassado diariamente. Em seus momentos de reflexão, o indivíduo “B” costuma pensar: “maldita hora que eu fui ganhar aquele prêmio da loteria”.

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