segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

MAIS DO MESMO - Por Luciano Blandy

 
29 de setembro de 2006 - O voo 1907 da GOL é atingido em pleno ar por um jato Legacy pilotado por dois americanos que o conduziam aos Estados Unidos, causando a morte de 155 pessoas. Durante as investigações, foi constatada uma sucessão de erros e atos irresponsáveis, tanto dos pilotos do Legacy, quanto dos controladores de voo. Passados quase cinco anos da tragédia, maio de 2011 os dois pilotos foram "condenados" à prestação de serviços à comunidade nos Estados Unidos e um dos controladores de voo - Lucivando Tiburcio Alencar - também foi "condenado" à prestação de serviços à comunidade.

17 de julho de 2007 - Em meio a uma tempestade, o voo TAM 3054 que fazia a linha Porto Alegre-São Paulo, varou a pista do Aeroporto de Congonhas chocando-se com o prédio da própria companhia e causando a morte dos 187 ocupantes da aeronave, além de 12 pessoas no solo. Na época, levantou-se a hipótese de que o acidente teria sido causado por uma falha na reforma da pista do aeroporto, onde não fora instalado o grooving - aparato destinado a escoar a água das chuvas da pista, aumentando a aderência dos pneus das aeronaves no momento do pouso. Ao ser afastada essa possibilidade como a única causa do desastre, tornou-se famosa a imagem do Assessor Especial do Governo Federal - Sr. Marco Aurélio Garcia - fazendo gestos obscenos em comemoração ao fato de que o Governo, em tese, não teria responsabilidade pelo acidente. Em 19 de novembro de 2008, um inquérito de 13.600 páginas foi concluído, atribuindo a responsabilidade à cinco membros da ANAC, três diretores da INFRAERO e dois executivos da TAM. Ninguém foi punido. Marco Aurélio continua como Assessor especial do Governo Federal.

04 de janeiro de 2011 - Após a ocorrência de chuvas torrenciais, a região de Petrópolis, no Rio de Janeiro, foi praticamente riscada do mapa por inúmeros deslizamentos e uma enxurrada gigantesca que causaram dezenas de mortes e deixaram milhares de famílias desabrigadas. Pessoas do Brasil inteiro se apressaram a doar cestas básicas, roupas e dinheiro às vítimas. Pouco depois, descobriu-se que parte do dinheiro doado havia sido desviado por ONGS que se diziam incumbidas de auxiliar os trabalhos de reconstrução da cidade e que grande parte dos alimentos doados, apodreceu em galpões da prefeitura sem chegar a quem deles necessitava. Até hoje ninguém foi punido pelos desvios e as cidades atingidas continuam "em reconstrução".

27 de janeiro de 2013 - Um incêndio de grandes proporções destruiu a Boate Kiss, na cidade de Santa Maria, causando a morte de mais de duas dezenas de jovens que ali se divertiam. Pelo pouco que se sabe até o momento, o local não possuía Alvará dos Bombeiros e encontrava-se possivelmente superlotado. O vocalista da banda que tocava no local teria acendido um sinalizador que acabou por incendiar o revestimento acústico instalado no teto da boate, que não foi controlado porque os extintores de incêndio não funcionaram. Ao tentarem escapar das chamas, os clientes descobriram que o local só possuía uma saída apenas, que encontrava-se bloqueada por seguranças que insistiam que todos pagassem a conta antes de sair. Aqueles que correram para o banheiro, na tentativa de escapar pela janela basculante ali existente, foram surpreendidos com uma parede de madeira bloqueando a saída.

É triste, mas é real. Ninguém será punido com algo mais do que algumas cestas básicas ou prestação de serviços à comunidade. Os dramas pessoais que tanto indignam a tantos neste momento, daqui quatro ou cinco anos quando, com sorte, os processos criminais forem concluídos, se converterão nos mesmos muxoxos de balcão de padaria de sempre: "Você viu que absurdo? Esse país não tem jeito mesmo".

Resta a pergunta: Como nós, como povo, como sociedade, chegamos a este ponto de frieza, de desumanidade?

Não é coincidência e nem obra desta ou daquela facção política. Trata-se de uma estratégia estruturada, de longo prazo implantada há mais de 40 anos, que agora alcança seus nefastos objetivos: Manter um povo ignorante, iletrado e, por isso mesmo, manso e amestrado. A imoralidade, falta de respeito por si próprio e pelo próximo e o clima de "cada um por si" são apenas efeitos colaterais esperados e aceitáveis.

O homem se distingue dos demais animais pela sua capacidade de transmitir conhecimento à geração futura que, por sua vez, o enriquece com seu próprio intelecto e o transmite, enriquecido, à próxima e assim por diante. Sem essa transferência, não nos diferenciamos muito de qualquer outro animal. Vivemos conduzidos por instintos básicos - viver, procriar, buscar o próprio sustento. É a cultura que nos coloca freios entre o que é admissível fazer e o que não é.

O espertalhão que acionou um sinalizador em um ambiente fechado não tinha, provavelmente, capacidade intelectual para raciocinar (usar a razão) sobre as consequências que poderiam advir deste ato. O segurança que barrou as vítimas, impedindo que fugissem do incêndio, é um autômato. O "patrão" só o paga para não deixar ninguém sair sem pagar, não para raciocinar (usar a razão).

A falta de cultura, a carência de educação de um povo trás como consequência inafastável, à qualquer classe social, uma geração amoral, sem limites. Mesmo os donos da boate, ou os responsáveis pelas outras tragédias citadas neste artigo, se condicionam a viver na base do "cada um por si". Ora, porque eu vou agir corretamente se o meu vizinho não age igual?

Fala-se em falta de fiscalização. Um povo educado não faz o certo porque o guarda não está olhando, faz o certo porque é o certo.

Vai mudar? essa nova tragédia (mais essa!) vai contribuir para que outras não ocorram? Duvido. Enquanto a sociedade não se der conta e verdadeiramente exigir que nossos recursos sejam revertidos primordialmente para a criação de um sistema educacional sério, não ideologizado e que dê condições intelectuais para que o indivíduo se aprimore cultural e moralmente, continuarão a se repetir os casos escabrosos, em que irresponsáveis ceifam vidas e ninguém é punido.